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Zika imuniza contra dengue e vice-versa, indicam estudos feitos em Salvador

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Quem se cura da dengue tem chances de se tornar imune à zika e quem escapa da zika talvez adquira também imunidade à dengue, indicam dois estudos liderados por pesquisadores da UFBA, baseados em evidências coletadas em Salvador, publicados recentemente em importantes revistas científicas internacionais.

O mais novo deles, “Impact of preexisting dengue immunity on Zika virus emergence in a dengue endemic region” (em tradução livre, Impacto da imunidade pré-existente à dengue na emergência do vírus Zika numa região endêmica de dengue), publicado no início deste mês na revista Science, propõe a tendência de imunização contra a zika após a dengue. Integram o grupo internacional e multidisciplinar de autores do artigo os professores Federico Costa – que liderou a pesquisa de campo, base do estudo – e Guilherme Ribeiro, ambos do Instituto de Saúde Coletiva (ISC), e Mittermayer Reis, da Faculdade de Medicina, além dos doutorandos Nivison Nery Júnior e Daiana De Olivera.

Um ano antes, em fevereiro de 2018, o artigo “Does immunity after Zika virus infection cross-protect against dengue? ” (A imunidade após o vírus Zika protege também contra a dengue?), publicado no periódico The Lancet Global Health, propusera a tendência inversa, com base nas evidências de que, após o surto de zika, em 2015, houve uma queda significativa na incidência de dengue em Salvador. O autor principal do paper era Guilherme Ribeiro e, da UFBA, ainda o assinavam os professores Mittermayer Reis e Gúbio Soares (ISC).

Zika e dengue são arboviroses transmitidas pelo mosquito aedes aegypti, ambas provocadas por vírus “primos”, do tipo flavivirus. Ambos os estudos foram subsidiados por evidências coletadas no bairro do Pau da Lima, no subúrbio da capital baiana, foco do surto de zika registrado em 2015, e fazem parte do conjunto de pesquisas lideradas pela UFBA e pela Fiocruz Bahia que tem consolidado, como indicou reportagem publicada no Edgardigital, Salvador como um grande laboratório de estudos sobre zika, dengue e outras arboviroses.

O artigo publicado pela Science apontou que amostras de sangue de pacientes que já haviam contraído dengue, coletadas antes do surto da zika, em março de 2015, reagiram positivamente a testes que detectam a presença de anticorpos que protegem contra a zika. Contudo, segundo o professor Federico Costa, essa imunização variou conforme a quantidade de anticorpos contra a dengue encontrados nas amostras. “Quanto mais anticorpos de dengue encontrados, menor a chance de infecção por zika”, afirma Costa.

O estudo traz ainda outros dois dados importantes. Primeiro, confirma incidência de aproximadamente 73% do vírus da zika nas 1453 amostras colhidas na localidade, com uma variação de 29% a 83% do alcance da doença, a depender da área do bairro. Ou seja, é provável que mais de 7 de cada 10 moradores do bairro tenham contraído zika no surto de 2015. E, segundo, confirma que quem se curou da zika adquiriu imunidade contra a doença.

Já o paper publicado pelo Lancet havia mostrado uma significativa queda de casos de dengue após o surto de zika de 2015. Das 1937 amostras de pacientes com febre aguda colhidas antes do surto, entre janeiro de 2009 e março de 2015, 484 (25%) eram casos de dengue. Nas 1334 amostras colhidas após o surto, entre abril de 2015 e maio de 2017, apenas 43 (3%) eram casos de dengue.

Na análise estendida a dados coletados pela Secretaria Municipal de Saúde de Salvador, em que se tem um total de 40.904 pacientes cujos testes deram positivo para dengue num período de pouco mais de 8 anos, isto é, de janeiro de 2009 a maio de 2017, verificou-se que, se a incidência da dengue era de 31% da amostra antes do surto de zika de 2015, ela caiu para 8%, após o surto. Segundo o estudo, os dados disponíveis “sugerem que as infecções pelo vírus Zika podem induzir imunização cruzada contra o vírus da dengue”, muito embora ainda sejam necessários para comprovar definitivamente essa hipótese.